Antes de mais, e sem menosprezar o excelente e extenso talento musical de Frank Zappa, não é para isso que vos escrevo hoje. O que agora vos exponho é a luta que o mesmo travou com a direita conservadora norte americana: uma guerra pela liberdade de expressão.
No seu núcleo, trata-se de uma batalha contra o politicamente correto, o que eleva a situação a um caráter humorístico, visto que, atualmente, o mais habitual é que se imagine o politicamente correto como um problema inerente às políticas de esquerda.
Passando à situação em concreto, até aos anos 80, encontramos um Frank Zappa, que apesar de manifestar interesse na mesma, nunca usara a sua música ou a sua posição de forma a influenciar a opinião política do público norte americano. Porém, em 1984, entra em ação a associação Parents Music Resource Center, que entre as suas fundadoras possuía Susan Baker e Tipper Gore – esposas de James Baker, Secretário do Tesouro; e de Al Gore, futuro vice-presidente norte americano.
O PMRC surge quando Susan Baker é confrontada com as perguntas da sua filha, ainda criança, que lhe perguntou o que era uma virgem. Quando, incrédula, Susan Baker lhe questiona o porquê, esta responde com uma música da Madonna: “Like a Virgin, touched for the very first time”. Assustada com o poder influenciador da música, apresentou as suas preocupações a um grupo de confidentes, que concordaram em passar à proatividade de forma a proteger as crianças dos perigos inerentes à cultura musical dos anos 80.
Com isto, é lançada uma lista de 15 músicas onde, para a PMRC, os autores foram longe demais.
Artista |
Canção | Problema do Conteúdo | |
1 | Prince | Darling Nikki | Sexo / masturbação |
2 | Sheena Easton | Sugar Walls | Sexo |
3 | Judas Priest | Eat Me alive | Sexo |
4 | Vanity | Strap on Robbie Baby | Sexo |
5 | Mötley Crüe | Bastard | Violência |
6 | AC/DC | Let me Put My Love Into You | Sexo |
7 | Twisted Sister | We’re Not Gonna Take It | Violência |
8 | Madonna | Dress You Up | Sexo |
9 | W.A.S.P. | Animal (Fuck Like a Beast) | Sexo |
10 | Def Leppard | High’n Dry | Consumo de Drogas e álcool |
11 | Mercyful Fate | Into the Coven | Ocultismo |
12 | Black Sabath | Trashed | Consumo de Drogas e álcool |
13 | Mary Jane Girls | In My House | Sexo |
14 | Venom | Possessed | Ocultismo |
15 | Cyndi Lauper | She Bop | Sexo / Masturbação |
O principal objetivo passava por impedir a utilização de certas palavras no lingo musical, tendo por base a moralidade cristã, o que levou Frank Zappa a defender a sua posição, e despindo-se dos seus longos cabelos para “se integrar no mundo dos negócios”, Zappa vai a uma audiência no Senado Americano, onde apresenta soluções paras as preocupações parentais, fazendo um compromisso de que seria colocado um rótulo para que os encarregados de educação pudessem saber da existência de conteúdo explícito em tal disco.
https://www.youtube.com/watch?v=hgAF8Vu8G0w&t=1236s
Apesar de Zappa não ser mencionado entre os 15 julgados, o mesmo sentia revolta pela simples existência de uma lista de matéria a ser censurado, e observando a inércia da indústria pelo medo das repercussões que tal defesa pudesse ter na sua carreira, Zappa avançou.
Hoje conhecemos esse rótulo como “Parental Advisory Explicit Content” com normalidade, com muitos até os procurarem como marca da sua preferência musical, contudo, o mesmo foi como uma derrota para Frank Zappa, que via a existência de um rótulo como uma barreira na liberdade de expressão, como podemos ver na entrevista ao Crossfire.
Não obstante a sua luta, Zappa acabou por enfrentar as consequências dos seus atos quando, após ser nomeado pelo presidente da Checoslováquia como embaixador para os interesses turísticos e culturais com os Estados Unidos da América, é afastado por ameaça de James Baker ao presidente recém-chegado ao poder. Se queria o apoio norte americano, não poderia ter Zappa como seu maior representante.
Hoje, o rótulo é quase uma presença obrigatória para um álbum constar nos mais ouvidos, existindo mais como uma marca de orgulho do que censura, mas para a sua chegada, foi necessário o susto da exclusão, que nos deixou com uma playlist fantástica de 15 músicas que marcam bem a cultura do início dos anos 80.
“If it looks like censorship and if it smells censorship, then it’s censorship, no matter who’s wife is talking about it. It’s censorship.”
Frank Zappa
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texto por: Nuno Alves (previamente publicado em diztopia.pt)